Sorrisos plastificados e abraços bem enlaçados. Uma
família cheia de afeto, todos se amando. A família de porta retrato mostra-se
tão unida, aparenta uma felicidade tão perfeita que todos invejam: queriam ter
uma família assim, mas não conseguem entender o que há de errado com a sua
própria, só a dos outros é que funciona, ou parece funcionar. Como assim?
Existe uma organização na família perfeita que determina a função de cada
membro: o pai age assim, a mãe daquele jeito, os filhos sempre fazem a mesma
coisa? Na família de porta retrato, tudo é igual, a felicidade constante e os
sorrisos não desaparecem nunca. A foto está sempre lá como prova.
A família de porta retrato sempre tem a mamãe e o
papai que resolvem tudo em consenso. Eles sentam, conversam bastante, se
entendem e decidem juntos as pendências da casa. Os filhos são respeitosos e
exemplares, seja na vida escolar, seja com os amigos, seja com os parentes nas
reuniões bem-vindas. Essas reuniões de família nunca são muito diferentes:
ninguém fala mal dos outros parentes, uma união perfeitamente harmoniosa que dá
inveja aos vizinhos daquela casa em que ocorre o encontro. As pessoas falam
baixo, álcool só no limite da razão para não estragar a foto. Por um segundo, a
imagem outrora capturada parece concretizar-se em ação no mundo real.
Não entendo da arte da fotografia, mas ouso dizer
que o fotógrafo busca o melhor momento quando captura uma imagem. A família de
porta retrato, ao contrário, posa para a melhor imagem ser gravada, eternizando
a felicidade que quer mostrar, porque impera a necessidade de manter sobre a
estante da sala a foto da família perfeita. “Nossa! Que família linda você tem!
Seus filhos são uma graça!” deve ser o mínimo que se ouve de quem visita aquela
casa. Mínimo porque conseguiram uma imagem tão profissional que nunca ninguém
poderá pensar menos que isso.
Aliás, menos não existe no vocabulário da família
de porta retrato. Ela precisar ser sempre mais, sempre a melhor. Não falta
sorriso, não falta alegria, não falta união, não falta amor. Tampouco falta
mentira para manter por tanto tempo uma fotografia ensaiada na sala, que já se
cansou de tudo aquilo. A sala não se preenche mais com porta retratos, chega
uma hora em que a família só vive neles, mas os familiares não cabem mais no
mesmo cômodo. Quando a família cai, não sobra nem sala.
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