domingo, 30 de dezembro de 2012

Imagens para representar



Mantinha os olhos sem maquiagem, acreditando numa impossível não identificação de quem era. Ele se mostrava másculo, rude até, um exemplo de homem com que toda mãe sonha. Não sabia, a mãe, do sonho desse moço infeliz: queria ser drag queen. Ver aquele brutamontes montado e com nome espalhafatoso, com roupas gritantes... era a última coisa que se poderia imaginar! Onde se esconderia a performance de uma drag naquela aparência de homem? Meu Deus!, gritariam as vovós, mas logo estariam aplaudindo as palhaçadas das ladies, encontrando o que havia de melhor em seus netos, encontrando uma alegria até então escondida, um sorriso que sempre esperavam no almoço, mas era de noite que veriam seus queridinhos, agora montados, radiantes.

sábado, 3 de novembro de 2012

Um sonho tão azul



Já não importa mais os sonhos que ando tendo – mesmo porque eu não os recordo. Só me interessa a certeza de que penso em você quando estou acordado, consciente de cada desejo.

Foi assim que me dei conta de que a paixão estava por perto: dar-me conta da falta dos sonhos, ao mesmo tempo em que percebi não pensar em outra coisa, senão você. 

Entre tanta gente que entra e sai dessas beiras da vida, quem diria que uma trombada que dei com seus olhos azuis poderia deixar uma marca tão forte em mim, mas tão forte que seria capaz de me fazer querer te rever a todo custo? Esses encontros que a vida promove entre as pessoas são o que nos fazem melhorar, mudar, ver o horizonte de outra forma. Se não fossem os encontros, seríamos almas perdidas... Não teríamos com quem compartilhar ideias, sequer as teríamos...

Minha mente hoje me prega uma peça. Me faz delirar, ver em frente a meus olhos o tempo todo um azul celestial, um azul de mar, profundamente iluminado. E me faz querer mais coisas que a vida já oferece. Me faz querer mais encontro. Mais ação. Quero mergulhar nesse seu mar azul que são os olhos, e ter a certeza de que a felicidade existe. Felicidade que nosso encontro me dá. Ainda que brevemente, é só aproveitar tanta alegria e troca de sorrisos, e a felicidade já terá sido vivenciada. Não deve ser delírio isso. É real o que vejo, é real o azul de seus olhos. Seus olhos azuis são reais, da realeza da felicidade.

Não mando em nada. Não decido nada. Não faço nada que você não queira. Jogue as cartas e dê as opções. Vamos explorar juntos as possibilidades da felicidade desse encontro. Os encontros. Nossos encontros. Que são rápidos, passam como um flash, uma batida de asas de beija-flor. Um piscar de olhos azuis...

Para que saber da vida se o que mais importa é esse instante em que compartilhamos sorrisos e olhares, esse instante que dura pra sempre?


 “Depois de ter você, pra que querer saber que horas são? Se é noite ou faz calor? Se estamos no verão? Se o sol virá ou não? Ou para é que serve uma canção como essa?”


segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Da alegria e da primavera

Depois de ter seu sorriso gravado em mim, tudo o mais é de cor alegre. O sempre pensar que sua risada salva meu dia, mesmo que no fim do pôr-do-sol, é o que me deixa viver toda tormenta que se apresenta.

As flores não são mais da primavera, elas desabrocham a qualquer tempo, no meio da noite, interrompem o soluço do choro estrondoso... Mas as flores não são mais da primavera, e nem sempre trazem uma alegria quando se abrem.
Conheci seu sorriso, que se mostra não a qualquer tempo, mas a todo tempo. O brilho do seu olhar contamina seus dentes e se irradia em mim. Você tem esse poder de primavera. Espero que agora isso dure em todas as estações.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Família de porta retrato


Sorrisos plastificados e abraços bem enlaçados. Uma família cheia de afeto, todos se amando. A família de porta retrato mostra-se tão unida, aparenta uma felicidade tão perfeita que todos invejam: queriam ter uma família assim, mas não conseguem entender o que há de errado com a sua própria, só a dos outros é que funciona, ou parece funcionar. Como assim?  Existe uma organização na família perfeita que determina a função de cada membro: o pai age assim, a mãe daquele jeito, os filhos sempre fazem a mesma coisa? Na família de porta retrato, tudo é igual, a felicidade constante e os sorrisos não desaparecem nunca. A foto está sempre lá como prova.

A família de porta retrato sempre tem a mamãe e o papai que resolvem tudo em consenso. Eles sentam, conversam bastante, se entendem e decidem juntos as pendências da casa. Os filhos são respeitosos e exemplares, seja na vida escolar, seja com os amigos, seja com os parentes nas reuniões bem-vindas. Essas reuniões de família nunca são muito diferentes: ninguém fala mal dos outros parentes, uma união perfeitamente harmoniosa que dá inveja aos vizinhos daquela casa em que ocorre o encontro. As pessoas falam baixo, álcool só no limite da razão para não estragar a foto. Por um segundo, a imagem outrora capturada parece concretizar-se em ação no mundo real.

Não entendo da arte da fotografia, mas ouso dizer que o fotógrafo busca o melhor momento quando captura uma imagem. A família de porta retrato, ao contrário, posa para a melhor imagem ser gravada, eternizando a felicidade que quer mostrar, porque impera a necessidade de manter sobre a estante da sala a foto da família perfeita. “Nossa! Que família linda você tem! Seus filhos são uma graça!” deve ser o mínimo que se ouve de quem visita aquela casa. Mínimo porque conseguiram uma imagem tão profissional que nunca ninguém poderá pensar menos que isso.

Aliás, menos não existe no vocabulário da família de porta retrato. Ela precisar ser sempre mais, sempre a melhor. Não falta sorriso, não falta alegria, não falta união, não falta amor. Tampouco falta mentira para manter por tanto tempo uma fotografia ensaiada na sala, que já se cansou de tudo aquilo. A sala não se preenche mais com porta retratos, chega uma hora em que a família só vive neles, mas os familiares não cabem mais no mesmo cômodo. Quando a família cai, não sobra nem sala.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Deixa queimar



Uma tradução para aquecer do frio do outono. Uma chuva quente para tirar o sono dos apaixonados. Uma tradução do inglês. Uma tradução da dor. Um sofrimento a mais e mais um dia sentindo o coração ofegante como nunca. Não bastasse a doçura da voz da cantora britânica Adele e a letra da música ‘Set fire to the rain’ que ela canta, ainda temos a chance e o prazer de ler a tradução poética do querido Carlos Emilio Faraco (Twitter @carlosemilio). É meio surreal essa música, e fica mais linda na versão em português. Um amor que me salva da morte, mas que depois se apresenta como mentiroso. Para me vingar, eu incendeio a chuva para te queimar enquanto eu sofro com mais um engano. Fiquei apaixonado pela tradução do Carlos, não há expressão melhor que a dele. O amor e a dor sempre ardem, cada um a seu modo. A paixão é sempre sofrida. Quem consegue ser forte? Quem não fica fraco diante de uma ilusão apaixonada? Impossível não se deixar enganar, mesmo quando as mentiras são desfeitas. Afinal, por pior que você tenha agido, você me salvou em algum momento. E mesmo me fazendo sofrer, eu continuo te querendo. Mas tenho que vencer esse querer, porque sua salvação não foi sincera. Você mentiu o tempo todo e esse amor que eu sinto é real, mas o que você me trouxe, não. A chuva que quero para você não é apenas a que te molha. É, antes, a que te queima, a que me vinga da tua crueldade.

Incendiei a chuva

(tradução de Carlos Emilio Faraco)

Deixei meu coração tombar
E você o deteve na queda, como se fosse seu.
Vagando na escuridão, eu atingia meus limites,
Quando teus lábios socorreram minha respiração.

Minhas mãos? Ah, estavam fortes,
Mas com elas não rimava a frouxidão dos meus joelhos
E eu não pude evitar
De reverenciar teus pés.

Vassalo, não decifrei
O teu lado obscuro, escuro, duro:
Tudo o que você disse
Era mentira, engano, logro.
E os jogos, com cartas marcadas,
Você vencia sempre e sempre...

Mas eu incendiei a chuva
E fiquei olhando ela fagulhar teu rosto.
E ela queimava enquanto eu chorava,
Pois eu ouvia gritos líquidos
Clamando teu nome, teu nome.

Quando me deito com você,
Posso me liquefazer ao teu lado,
Cerrar os olhos,
Sentir- te onipresente:
Nada pode ser melhor
Do que eu somado a você.

Vassalo, não decifrei
O teu lado obscuro, escuro, duro:
Tudo o que você disse
Era mentira, engano, logro.
E os jogos, com cartas marcadas,
Você vencia sempre e sempre...

Mas eu incendiei a chuva
E fiquei olhando ela fagulhar teu rosto.
E ela queimava enquanto eu chorava,
Pois eu ouvia gritos líquidos
Clamando teu nome, teu nome.

Eu incendiei a chuva
E nos enlaçamos nas chamas,
Enquanto algo queimava para sempre
Pois eu sabia que era a última vez,
A última vez.

Às vezes eu acordo ajoelhado na porta.
Aquele coração que você aparou, ainda espera por você.
E mesmo agora, depois do ponto final,
Eu não consigo não te procurar.

Mas eu incendiei a chuva
E fiquei olhando ela fagulhar teu rosto.
E ela queimava enquanto eu chorava,
Pois eu ouvia gritos líquidos
Clamando teu nome, teu nome.

Eu incendiei a chuva
E nos enlaçamos nas chamas,
Enquanto algo queimava para sempre
Pois eu sabia que era a última vez,
A última vez.
A última vez.

Oh!
Deixa molhar,
Deixa arder,
Deixa queimar.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Um mês e mais nenhum dia


Hoje é comercialmente o dia dos namorados. E das namoradas. E dos namorados com as namoradas. Na verdade, é mais um dia normal, como todo dia. Mas vou aproveitar a data comercial para falar – mais uma vez – sobre amor e frustração, que é o assunto mais comum neste blog. O relato a seguir é de algo que ocorreu há 7 anos, vejam quanto tempo! Passei o fim de semana revirando CDs com arquivos antigos e encontrei alguns textos perdidos, entre os quais o que segue. Notem que minha vida sentimental quase não mudou nesse período, parece que as histórias sempre se repetem. Será que só comigo isso acontece?

Um mês e mais nenhum dia

Citando uma música do Jota Quest “Essa não é mais uma carta de (des)amor, são pensamentos soltos traduzidos em palavras, pra que você possa entender, o que eu também não entendo. Amar não é ter que ter sempre certeza, é aceitar que ninguém é perfeito pra ninguém, é aceitar ser você mesmo...”

Nº de vezes que enviei e-mail: 3
Nº de vezes que liguei: sem precedentes, sem sucesso
Nº de vezes que chorei: incontável

A solidão às vezes faz bem, mas é melhor quando se está só por escolha própria do que pelo desprezo do próximo. É melhor estar só acompanhado de seus pensamentos positivos e planos, do que acompanhado de uma incerteza, sem saber o motivo que resultou nessa solidão. É muito bom conhecer pessoas novas, diferentes, ainda mais quando existe carisma, atração, quando nasce uma relação do que parece ser um simples encontro. E essa relação – atente-se – pode ser de diferentes formas. Pode ser uma simples amizade, uma amizade colorida, ou ainda uma paixão ardente. Claro que isso ninguém escolhe, ninguém aciona um botão no coração que faz o que você quer, ninguém escolhe se apaixonar, ninguém escolhe ter afinidades, as coisas apenas acontecem no seu fluxo natural. Mas nem sempre esse fluxo nos parece natural. Principalmente quando é interrompido, seja lá qual for o motivo. 

Vejamos um exemplo. Você conheceu uma pessoa. A princípio é apenas uma companhia para falar ao telefone depois do trabalho, para se comunicar pelo celular, por e-mails. Depois tornam-se companheiros de cinema, sempre juntos admirando a 7ª arte. Então passam para algo mais íntimo, ainda no campo da amizade: vão assistir a um DVD, convidado e na casa da sua companhia. DVD é pouco, resolvem fazer pizza juntos. Olha que legal! Assistir a um DVD comendo a pizza que vocês mesmos preparam. É interessante lembrar que sempre deixamos claro qual a nossa intenção nisso tudo: amizade! Bom, a pizza não demora muito e logo está no forno. Ham... Estamos famintos. Enquanto isso vamos ao DVD. 2001 – uma odisséia no espaço. Já tinha ouvido falar, mas nunca havia assistido – e não foi dessa vez que assisti – e confesso não ter me empolgado muito com o filme, o que nos fez desistir no meio do caminho. Mas ainda tinha uma pizza para devorar, o que nos animou. Pronto, a pizza está no ponto, e aparentemente uma delícia... É, confesso que já comi pizzas melhores, e muito melhores, mas tudo bem, não passamos fome. Conversamos mais um pouco, logo fui embora. Apesar de o filme e a pizza não terem sido tão bons assim, a companhia daqueles momentos foi interessante. Combinamos de novo, e lá fomos nós para outra sessão de “cinema em casa”. O filme dessa vez me foge à memória, ou teríamos assistido à TV? Isso pouco importa, porque no meio do filme ou do programa de TV, seja qual for, aconteceu algo que nunca sequer jamais deveria ter acontecido: um toque. Mas para explicar esse “toque” vou descrever a situação em que nos encontrávamos dispostos na “sala de TV”, que na verdade era o próprio quarto, já que a casa não era nada grande. Estávamos sentados na cama, sob o edredom, já que estava frio. Agora volto ao toque. Então, o toque... Aconteceu sob o edredom, senti seus dedos tentando tocar minha mão, meu coração disparou, me vieram zilhões de pensamentos, sem saber o que fazer. Finalmente, decidi que ia deixar rolar. Me arrependo! Não pensem vocês que não foi legal, mas a forma como tudo acabou foi um tanto quanto estranha (acho que nem começou, mas vocês sabem, eu sou muito “bobão” mesmo, acredito em contos de fadas, duendes, Papai Noel, coelhinho da Páscoa, etc.).

Mas, claro, antes de descrever como “tudo acabou”, vou continuar o que falava. Os toques... Foram emocionantes. Me senti um garotinho tentando seu primeiro beijo, foi SIM-PLES-MEN-TE LIN-DO. Pena que acabou. Os toques... de repente se transformaram em carícias na nuca, afago no rosto, no cabelo, que lindo isso tudo. Nos olhamos nos olhos poucas vezes, mas me lembro até hoje daquele olhar de quem parecia ser ainda criança. Acho que não era mais. Mas para mim sim... Que saudade.
Smack! Ops, nos beijamos... Foi lindo, mágico... Não deveria ter acontecido. Ficamos juntinhos até tantas da madrugada, nos tocando – sem intenções sexuais, obviamente. Fui embora. Nos falamos no dia seguinte. Nos vimos no dia seguinte, e em todos os seguintes dias até o final daquele mês. Nos conhecíamos. Ou não. Percebi, com o tempo, sua timidez e sua introspectividade, não falava de si, não me deixar conhecer seus pensamentos, não me compartilhava seus sentimentos. Eu, particularmente, sou meio “grudento”. Sabe aquela pessoa que vive “lambendo”, beijando toda hora? Então, sou eu. Eu acho que isso não agradou muito, porque depois de uns dias percebi certo distanciamento, me negava beijos, dizia estar sem vontade naquele momento, mas depois, quando eu pedia outro, me negava novamente. Não me importei. Ficar junto estava sendo suficiente para mim. Aquele anjinho dormindo todos os dias depois do trabalho também não me incomodava, e eu acompanhava tudo, fazendo carinho e dando beijinhos enquanto dormia meu anjo. Não pensava em mais nada, só esperava o momento de chegar o fim da tarde e o anoitecer. Chorei na sua frente algumas vezes, duas talvez, cobrando mais proximidade, mas era uma pessoa fria, o que eu poderia fazer, as pessoas são diferentes mesmo, não são? Aceitei, mas sempre tentava entrar no assunto “sentimento”. Inútil. Fugia do assunto, desconversava, fazia tudo parecer natural, como se minhas perguntas não existissem. Não me arrependo de ter “corrido atrás”, insistido da forma como insisti. O que acontece é que não sou tão orgulhoso assim e não tenho vergonha de buscar minha felicidade. Sentimentos para mim não são motivo de humilhação. Amar não é feio! Um dia, mais uma vez no cinema, tentei abordar novamente o assunto, questionando sobre suas intenções a meu respeito. A resposta veio: “Quero com você aquilo que combinamos quando nos conhecemos”. Bom, para quem não se lembra, o “combinado” era apenas “amizade”. Não nego que vivíamos uma amizade, colorida claro... Isso me deixou inquieto demais, e naquela noite insisti até o ponto de me tornar inconveniente, mas nenhuma resposta veio, eu lhe perguntava na sua frente, e parecia que eu nem estava lá, ou que eu não havia dito nada. 

Me senti tão triste. E ainda me sinto assim. Nesse momento eu já tinha a certeza do que viria depois. Quando estávamos na porta de sua casa, me deu uma desculpa que estava com muita dor de cabeça e que por isso não me convidaria para entrar, que depois nos falaríamos. Entrou. Chorei. Chorei. Chorei. Ah, bem lembrado, quase todas as vezes em que eu pedia o beijo e que me era recusado, a dor de cabeça era a desculpa de praxe. Foi tudo muito estranho: primeiro amizade, conforme combinado. Mas como sentimento a gente não controla, depois aconteceu algo mais. E, depois de até beijar na boca e me ouvir dizendo que gostava de estar ali e tudo mais, me diz que não tinha nenhuma outra intenção senão amizade. Mas espera aí. Que amizade era essa combinada que permitiu beijo na boca? Sem comentários. E agora parece que nem essa amizade “pura” existe mais. Então acabou assim, eu sem saber porque se “entregou” pra mim num momento e no outro disse que não queria mais nada. Foi muito rápido, muito bom, mas muito sofrido, dolorido, machucado. Não entendo como uma pessoa que aceita uma outra em sua casa todos os dias, recebe carícias, beijos, tortinhas de morango, pode simplesmente sumir no mundo, não atender telefonemas, ou mesmo responder e-mails. Eu até perguntei certa vez “Você gosta de mim?” e veio a resposta “Gosto mais quando você traz tortinha de morango” me disse isso um dia depois de tê-la levado. Como não sei o que se passa naquela mente, fica tudo assim, sem compreensão. Agora me encontro só, acompanhado de uma incerteza, sem saber o motivo que resultou nessa solidão. Eu apenas gostaria de saber o porquê.
Por quê?

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